
A vida é feita de pequenas e grandes histórias, boas ou más, da junção delas que costuradas umas às outras vão dando forma à pessoa que somos, que nos vamos tornando…SOMOS uma COLCHA DE RETALHOS que está em constante modificação, crescemos na medida em que juntamos mais um retalinho e cada um deles é importante: tenha nos retirado sorrisos ou lágrimas…e o lindo de imaginar a vida assim é que jamais terminaremos da mesma forma que começamos, estamos em constante transformação (ainda bem)… nós e tudo a nossa volta, a nossa forma de ser, de estar e de olhar…
Hoje (26 de dezembro de 2024) costuro um dos pedacinhos na minha colcha que completa dezanove anos…o pedaço que mexeu com a minha mesmal, transformando o meu interior profundamente…
Fez-me sentir os sentimentos mais ambíguos, dor e felicidade tudo junto e misturado…sem que eu soubesse que isso fosse sequer possível.
Há dezanove anos tomei a decisão mais difícil da minha vida, mas não hesitei…e num ato impulsivo, mas pensado, sentindo-me livre, honesta com os meus propósitos e objetivos, e liberta de qualquer paradigma, reuni toda a força que andava parada cá dentro, mexi-me por dentro, coloquei-me numa posição totalmente desconfortável decidindo assim o meu futuro…
Olhei para trás e não quis aquele cenário para o resto da minha vida, estava numa posição confortável, estava sendo reconhecida no meu trabalho, em visível ascensão pessoal e profissional, tinha uma vida plena e social, mas sentia sempre que faltava algo…era o meu coração que avizinhava o amor…
Olhei em frente e, apesar de sentir medo do desconhecido, reconheci ali o cenário perfeito para a vida que sempre sonhei: uma vida plena de amor e dedicação mútua ao lado da pessoa que eu escolhi para envelhecer ao lado…e só!
Era uma vida sem promessas, sem emprego, sem a minha família, sem amigos…Um bilhete direto para nenhures e NADA, um ‘planeta’ distante da minha casa com apenas UM habitante e uma promessa: AMOR!
E foi assim que tomei a decisão mais difícil da minha vida, troquei um TUDO por um NADA que para mim era mais que TUDO!
Mergulhei de cabeça sem saber sequer se havia água para me acolher…simplesmente deixei o meu coração guiar-me, confiando que ele sempre quererá o melhor para mim…
E hoje fazendo um balanço destes dezanove anos, olhando para esta minha colcha de retalhos, vejo que eu precisei trilhar este caminho, e realmente o meu coração, mais uma vez, não estava enganado…a minha colcha, agora muito maior, conta histórias de amor, de dedicação à minha família, de entrega, de recomeços, de aprendizagens, de tombos e desgostos necessários, de tristezas incontornáveis, de saudades que ardem sem parar, de dores que tive que aprender a conviver…Mas sobretudo, o que sobressai nesta colcha é o AMOR que costura com linha forte e inquebrável todos os seus pedaços… Não há nada, nem sequer um pequeno pedaço desta colcha, que não esteja costurado com amor…PORQUE EU JAMAIS ESTAREI ONDE NÃO HOUVER AMOR.
E relembrando aquele 26 de dezembro de 2005, impossível é conter as lágrimas…passeio na memória pelas imagens daquele dia tão triste e tão feliz ao mesmo tempo – agridoce…revejo as despedidas da minha família, no aeroporto, sinto de novo os sentimentos que senti…vejo cada expressão da minha mãe, do meu pai, das minhas irmãs…cada um deles a reagir à sua maneira…
Frases soltas…vezes sem conta eu volto a ouvir daquele dia de despedidas, que enchem o meu coração de saudade, mas também de orgulho por não terem impedido que mais um pedaço desta colcha fosse costurado…
‘Vai ser feliz filha! Nós estaremos sempre aqui à sua espera…aconteça o que acontecer você é nossa…’ (meu pai)
‘Tenho orgulho de você maninha…’ (Vivi)
‘Tenho medo que nos esqueça…’ (Vaninha)
‘Voa minha sementinha, para longe da mamãe…’ (minha mãe)
Estas frases ecoam em mim desde sempre…para sempre…A saudade e a nostalgia do ninho me acompanham nesta longa caminhada…aprendi a conviver com o vazio que nunca conseguiu ser preenchido, ainda me sinto parte da minha manada, apesar de estar longe da minha selva…
Vejo de longe o costurar das colchas das minhas irmãs, e cada vez que nos revemos, ganhamos uma nova ruga…ficamos satisfeitas por sentir o nosso amor incondicional, de longe…perdemos muito pelo caminho, mas permanecemos unidas apesar de tudo!
SOBRE O PLANETA COM UM HABITANTE E UM SENTIMENTO? TAMBÉM MUDOU…
Hoje tenho um planeta rodeado de alegria! Minhas filhas cresceram, primeiro, foram as fitas cor-de-rosa, bonecas e tartarugas espevitadas que enfeitaram os meus dias ao lado das pessoas mais importantes da minha vida…elas chegaram para dar cor, odor e som aos meus dias…hoje apesar de ouvir mais silêncio e sentir a solidão própria das mães de adolescentes, tem todo o resto que vem desta fase que apesar de nos tirar o conforto muitas vezes, nos enche de orgulho por vermos o resultado de um trabalho de anos de educação a ser sedimentado em boas bases. Tenho filhas valorosas!
Tenho orgulho da família que nos tornamos, do vínculo seguro que temos e da nossa UNIÃO incondicional…somos ninho e casulo.
Construí ao meu redor um lugar de amor, cheio de pessoas especiais que me querem bem…
…onde a reciprocidade permeia cada pormenor destas relações de afeto…
Sinto-me feliz, realizada, capaz de multiplicar o amor que recebo agora…
Sinto-me satisfeita por ter dado, há dezanove anos, este grande passo rumo a felicidade…
Sinto-me apaixonada, como estive quando cá cheguei, pelo homem que o meu coração escolheu…
Sinto-me orgulhosa da minha história de vida, e espero estar aqui para contar o tamanho da minha colcha de retalhos passados mais dez ou vinte anos desta vida que eu escolhi para mim…
A vida é uma colcha colorida de retalhos.
(texto reescrito e adaptado do meu texto de 2015)