ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA


Carta aberta a quem não enxerga a dor depois da cura

A você que olha, mas não vê.

Que julga o corpo, mas ignora a história.

Que diz fazer parte da história, mas desconhece por completo o seu processo.

Que acredita que a luta termina com o fim da quimioterapia ou quando o cabelo volta a crescer.

Quero te contar que a batalha contra o câncer de mama não termina no momento em que os exames mostram remissão. Para muitas de nós, a luta continua — silenciosa, exaustiva, persistente.

Você talvez não saiba o que é viver com medo constante da recidiva. Não entende o que é tomar, todos os dias, um comprimido chamado tamoxifeno…

MENOPAUSA INDUZIDA!

Coincidência ou não tenho ouvido falar muito em menopausa, peri menopausa e afins…a mim me calhou há dez anos, os sintomas, mesmo sintéticos, químicos, causados por este comprimido rosa chamado tamoxinferno, digo, Tamoxifeno…

…que vem com uma lista imensa de efeitos colaterais: ondas de calor, insônia, irritabilidade, dores articulares, e, sim, ganho de peso. Um peso que não é apenas físico — mas emocional, social, e muitas vezes, invisível aos olhos alheios, distraídos, pouco (ou nada) empáticos.

E mesmo assim, somos julgadas.

“Você engordou.”

“Está diferente.”

“Agora que já passou, é só voltar ao normal.”

Mas qual é esse “normal” que se espera de nós? O corpo muda, o metabolismo desacelera, a energia se esvai. O que você chama de “desleixo”, talvez seja uma mulher lutando para sobreviver, lidando com um organismo que já não responde como antes, tentando se reconhecer num espelho que não reflete mais a imagem de antes da doença.

A dor crônica não tem rosto.

O medo da recidiva não estampa camisetas.

E o sofrimento hormonal não aparece nas fotos de família.

Por isso, peço: RESPEITE!.

Antes de comentar sobre o corpo de alguém, pergunte-se se você conhece o caminho que ela percorreu.

Antes de questionar uma escolha, considere que talvez ela esteja fazendo o melhor que pode com a energia que tem.

Antes de sugerir dieta ou exercício, pense que essa pessoa talvez esteja apenas tentando passar o dia sem colapsar.

Lutar contra o câncer é difícil.

Lutar contra o preconceito depois dele, é cruel.

E mesmo assim, seguimos.

Com cicatrizes. Com dores. Com esperança.

Porque a vida continua. E nós também.

Com respeito, sofrendo mas sorrindo, todos os dias.

O Tamoxifeno tem data para acabar, 24 de setembro, depois disso estarei por minha conta e risco, 20 kilos a menos ou a mais? Importa? Há quem se importa com isto…a mim só me importa estar viva e continuar e sobreviver…que venha setembro…

Eu, uma mulher que sobrevive, todos os dias.

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